Princípios Constitucionais sobre Organização Administrativa

A nossa Constituição consagra um conjunto de princípios em matéria de organização administrativa.
Do artigo 267º/ 1 e 2 da Constituição portuguesa resulta:

1.Princípio da desburocratização
Este princípio, consagrado no artigo 267º/1 da CRP e no artigo 10º do CPA, incide sobre a organização e consequente eficiência da Administração Pública.
No primeiro plano, a desburocratização contraindica estruturas desnecessariamente complexas. No segundo plano, opõe-se a procedimentos demorados, formalizados e longos.
Assim sendo, a Administração deve organizar-se tendo em conta a eficácia na prossecução dos interesses públicos.
Exemplos de concretizações legislativas deste princípio são os artigos 57º e 58º do CPA.

2.Princípio da aproximação dos serviços às populações
Positivado no artigo 267º/1 da CRP e no artigo 10º do CPA, este princípio significa que a estruturação da Administração Pública deve atender à proximidade dos seus serviços junto dos cidadãos.
É sobretudo uma diretriz de caráter geográfico, mas pressupõe também uma aproximação psicológica e humana, tendo em conta a multiplicação do contacto com a população, de modo a que todos os problemas desta sejam solucionados.
Este princípio desdobra-se nos princípios de descentralização, da desconcentração e da participação dos particulares na gestão da Administração.

3.Princípio da participação dos interessados na gestão da Administração Púbica
Consagrado no artigo 12º do CPA, este princípio visa inverter a tendência de a população intervir na vida da Administração apenas através da eleição dos respetivos órgãos. Os cidadãos devem intervir também no funcionamento quotidiano da Administração, inclusive participando na tomada de decisões administrativas.
Assim, de um ponto de vista estrutural, a organização da Administração Pública deve ser pensada de tal forma que nela existam órgãos onde os particulares possam participar, onde possam ser consultados acerca de orientações a seguir e também onde possam tomar parte nas decisões a adotar.
De um ponto de vista funcional, decorre deste princípio a necessidade da colaboração da Administração com os particulares, presente no artigo 11º do CPA, e a garantia dos direitos de participação dos particulares na atividade administrativa.

4.Princípio da descentralização
Presente no artigo 267º/2 da CRP, este princípio pretende que as atribuições não essenciais do Estado sejam transferidas para a esfera de atuação dos municípios, de forma exponencial. Assim, a desconcentração pressupõe hierarquia.
Indica-se ao legislador um caminho para a estruturação da Administração Pública, no sentido da imposição da manutenção e do aprofundamento da descentralização administrativa já atingida. A lei nº 159/99, de 14 de setembro aponta neste sentido.
Certas categorias de pessoas coletivas, integradas na administração autónoma, são constitucionalmente garantidas. É o caso das Regiões Autónomas (artigos 225º e 288º da CRP), das autarquias locais (artigos 235º e 288º da CRP), das universidades públicas (artigo 76º/2 da CRP) e das associações públicas (artigo 267º/1 e 4 da CRP).
Não é suficiente que as várias pessoas coletivas, para além do Estado, exerçam a função Administrativa. É também necessário que a estas pessoas coletivas sejam atribuídas competências por forma a conseguir-se verdadeiramente a aproximação às populações e que lhes sejam atribuídos recursos financeiros e humanos para o exercício destas competências.
Existem várias modalidades de descentralização:
·         Descentralização territorial – Existência de várias pessoas coletivas de base territorial. Exemplo desta modalidade são as regiões autónomas e as autarquias locais.
·         Devolução de poderes – Aponta no sentido de atribuir tarefas materialmente administrativas a pessoas coletivas de direito privado;
·         Descentralização institucional – Pessoas coletivas de substrato patrimonial, como se verifica com os institutos públicos;
·         Descentralização Associativa – Pessoas coletivas de substrato associativo, sendo as universidades públicas um exemplo para esta modalidade;
·         Descentralização de primeiro grau ou originária – Resulta diretamente da Constituição;
·         Descentralização de segundo grau ou resultante de uma delegação de poderes – A lei confere competência a um superior, mas permite que este autorize adjuntos a resolver assuntos da sua competência. Um exemplo que ilustra este caso é a criação de empresas públicas municipais pelos municípios.
Apesar do incomensurável número de vantagens que a descentralização acarreta, também existem desvantagens, sendo exemplo destas a multiplicação de patrimónios autónomos e consequente exigência de gestão financeira.
A Constituição limita a descentralização com os poderes de tutela e superintendência, expressos no artigo 267º/2 da CRP.

5.Princípio da Desconcentração
Este princípio, consagrado também no artigo 267º/2 da CRP, implica que se prossiga uma política de desconcentração de competências.
Os artigos 199º/d e 271º/ 2 e 3 da CRP estabelecem uma hierarquia administrativa; já o artigo 111º/2 da CRP prevê a delegação de poderes.
O maior problema da desconcentração administrativa são as conhecidas restrições na prática da administração pública. Nesse sentido o legislador vem incentivá-la no artigo 27º do DL nº135/99, de 22 de abril.
A forma de desconcentração aplicada na administração portuguesa é a hierarquia, uma modalidade de desconcentração vertical.
A desconcentração é absoluta quando se processa num órgão com competência dependente; e relativa quando comporta vários graus, conforme a competência dependente seja comum ou própria. Caso a competência seja dependente própria, poderá distinguir-se entre a separada, a reservada e a exclusiva.
A desconcentração pode também ser originária, quando decorre da lei; e derivada, quando há delegação de poderes.
A desconcentração é limitada, através do poder de direção, pelo artigo 267º/2 da CRP.

Interessa referir que os dois últimos princípios estão sujeitos a limites, e, por isso, distinguem-se dos primeiros três por serem princípios absolutos. O princípio da desconcentração e o princípio da descentralização são princípios fundamentais da Constituição.

Bibliografia:
- AMARAL, Diogo Freitas do – Curso de Direito Administrativo, Volume I, 4ª Edição, Almedina, 2015.
- SOUSA, Marcelo Rebelo de; MATOS, André Salgado de – Direito Administrativo Geral – Introdução e Princípios Fundamentais, Tomo I, 2ª Edição, Dom Quixote, 2006.
- CAETANO, Marcello – Princípios Fundamentais do Direito Administrativo – 3ª Reimpressão, Almedina, 2010.


Sónia Duarte, nº 57315

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