Regulamentos e Atos Administrativos
Regulamento Administrativo
Os regulamentos administrativos são definidos, no artigo 135º do CPA, como
“as normas jurídicas gerais e abstratas que, no exercício de poderes
jurídico-administrativos, visem produzir efeitos jurídicos externos”.
Numa aceção mais ampla, para o Prof. Vieira de Andrade os regulamentos são
as “normas emanadas pelos órgãos ou autoridades competentes no exercício da
função administrativa, com valor infralegal e destinadas, em regra, à aplicação
das leis ou de normas equiparadas”. Além dos regulamentos tradicionais, a
definição oferecida abrange também os estatutos auto-aprovados de entes
corporativos ou institucionais, os regimentos dos órgãos colegiais, as
convenções administrativas de caráter regulamentar, os planos de gestão
territorial e os programas de concursos, nomeadamente no âmbito da contratação
pública.
O Prof. Freitas do Amaral menciona duas notas prévias à análise do
conceito: que o regulamento é uma fonte secundária do Direito Administrativo,
constituindo o elemento inferior do seu ordenamento jurídico, e que é um
produto da atividade administrativa indispensável ao funcionamento do Estado
Moderno.
A noção de regulamento comporta três elementos essenciais:
§ O elemento de natureza material
O regulamento administrativo deve caracterizar-se como uma norma jurídica:
geral, abstrata.
A característica da generalidade traduz-se na aplicabilidade do regulamento
a uma multiplicidade de destinatários, definidos por conceitos universais; e a
da abstração é traduzida na sua aplicação a situações indeterminadas.
Por ser uma verdadeira e própria regra de direito, o comando regulamentar
pode ser imposto mediante ameaça de coação e a sua violação é, geralmente,
conducente à aplicação de sanções.
§ O elemento de natureza orgânico-formal
O regulamento é, comummente, ditado por um órgão de uma pessoa coletiva
pública integrada na Administração Pública. Todavia, sendo o poder regulamentar
próprio da função administrativa e sendo esta por vezes exercida por pessoas
coletivas públicas que não incorporam a Administração e por entidades de
direito privado, também estes entes podem exercer poderes regulamentares.
Em todo o caso, exige-se sempre uma lei habilitante para o exercício do
poder regulamentar (art.º 136º/1 CPA) e todos os regulamentos estão submetidos
ao regime dos artigos 135º e seguintes do CPA.
§ O elemento de natureza funcional
Os regulamentos são emanados no exercício do poder administrativo. Deve
ter-se, por isso, presente que a atividade regulamentar é secundária,
dependente e subordinada à atividade legislativa, primária e independente. A
Constituição e a lei são, então, o seu “fundamento e parâmetro de validade”,
nas palavras do Prof. Freitas do Amaral.
Ato Administrativo
O ato administrativo tem o seu conceito definido pelo artigo 148º do CPA: é
a decisão que, no exercício de poderes jurídico-administrativos, vise produzir
efeitos jurídicos externos numa situação individual e concreta.
O Prof. Freitas do Amaral, por sua vez, apresenta o ato administrativo como
“o ato jurídico unilateral praticado, no exercício do poder administrativo, por
um órgão da Administração ou por outra entidade pública ou privada para tal
habilitada por lei, e que traduz a decisão de um caso considerado pela
Administração, visando produzir efeitos jurídicos numa situação individual e
concreta”.
Os seus elementos essenciais fazem do ato administrativo:
§ Um ato jurídico
É uma conduta voluntária produtora de efeitos jurídicos, sendo-lhe
aplicáveis, por via da regra, os princípios gerais de direito relativos aos
atos jurídicos.
O ato administrativo está submetido ao regime procedimental e substantivo
constante do CPA e é suscetível de ação impugnatória perante os tribunais
administrativos.
§ Um ato unilateral
Provém de um só autor, cuja declaração é perfeita, independentemente do
concurso de vontades de outros órgãos ou sujeitos de direito. A Administração
manifesta a sua vontade própria e isso é suficiente para que o ato exista e
esteja completo, correspondendo ao tipo legal em que se enquadra.
A larga participação dos particulares (sobretudo na audiência prévia) não
prejudica a unilateralidade do ato: não o transforma num contrato, apenas
aumenta a sua qualidade através de uma melhor ponderação dos interesses
envolvidos ou afetados – a decisão do caso cabe sempre e só à Administração, é
sua a última palavra.
§ Um ato praticado no exercício do poder
administrativo
O ato deve ser praticado no exercício do poder administrativo, porque só
estes são atos administrativos: praticados no exercício de um poder público, ao
abrigo de normas de direito público e para o desempenho de uma atividade
administrativa de gestão pública.
§ Um ato de um órgão administrativo
Trata-se de um ato praticado por um órgão da Administração Pública em
sentido orgânico, por um órgão de uma pessoa coletiva privada ou por um órgão do
Estado não integrado no poder executivo, por lei habilitados a praticar atos
administrativos.
§ Um ato decisório
O ato administrativo é uma decisão adotada no exercício de poderes
jurídico-administrativos. É, então, uma conduta administrativa suscetível de
afetar, por si só, imediata ou potencialmente, a esfera jurídica dos
particulares – produz uma transformação jurídica externa.
São decisões as pronúncias da Administração proferidas em inteira
subordinação à lei, as que revelam uma opção discricionária dos autores, as
agressivas da esfera jurídica dos particulares e as atributivas de vantagens ou
prestações.
São decisórios os atos que visem produzir efeitos jurídicos diretos no
ordenamento e aqueles que expressamente os recusam.
§ Um ato que versa sobre uma situação
individual e concreta
Reporta-se o ato administrativo à ideia de situação individual e concreta:
por princípio, ele
versa sobre uma determinada situação que afeta certos
indivíduos.
O conceito legal de ato administrativo comporta uma referência ao seu
caráter externo, convergindo com a posição defendida há muito pelo Prof.
Rogério Alves. Para ele, os atos administrativos têm eficácia externa por
constituírem ou modificarem relações intersubjetivas ou afetarem a situação
jurídica de uma coisa. Não serão, por conseguinte, atos administrativos os atos
internos, que tutelam as relações entre sujeitos autónomos e, por isso, não
relevam no ordenamento geral.
O Prof. Vieira de Andrade, a este propósito, distingue entre efeitos
jurídicos internos e externos “conforme atinjam, ou não, diretamente, a esfera
jurídica dos destinatários”. É um ato interno, por exemplo, aquele que
determina a abertura de um inquérito – atinge diretamente a esfera jurídica dos
sujeitos inquiridos.
Distinção entre regulamento
e ato administrativo
O regulamento e o ato administrativo são comandos jurídicos unilaterais,
emitidos por um órgão competente no exercício de um poder público de uma
autoridade. A sua distinção prende-se com a sua natureza: o regulamento é uma
norma jurídica, por definição, geral e abstrata; o ato administrativo, por
outro lado, é um ato jurídico, uma decisão individual e concreta.
Enquanto o regulamento define os seus destinatários e as situações da vida
a que é aplicável por meio de conceitos indeterminados, sem qualquer tipo de
individualização; o ato administrativo reporta-se a indivíduos específicos e
regula uma determinada situação, bem caracterizada.
O Prof. Freitas do Amaral aponta 3 situações em que esta distinção não é de
fácil operação:
§ Se o comando for relativo a um órgão
singular
Será norma se dispuser em função das características da categoria abstrata;
e ato se dispuser relativamente à pessoa concreta titular do cargo.
§ Se o comando for relativo a um grupo
restrito de pessoas, determinadas e determináveis
É norma se dispuser por meio de categorias abstratas; e ato se contiver uma
lista nominativa dos indivíduos abrangidos, devidamente identificados.
§ Se o comando geral for dirigido a uma
pluralidade indeterminada de pessoas, mas para ser aplicado imediatamente numa
única situação concreta
O Prof. Freitas do Amaral vê nesta situação uma norma, por considerar
existir generalidade; diferentemente, o Prof. Afonso Queiró considera estar-se
perante um ato administrativo.
Em suma: os regulamentos são normas jurídicas, gerais e abstratas, que regulam situações e aplicam-se indivíduos definidos por conceitos indeterminados (a título de exemplo, um regulamento de um concurso regula todas as situações dele emergentes e aplica-se a todos os seus concorrentes, sem qualquer especificação); os atos administrativos são atos jurídicos, por natureza individuais e concretos, reportando-se a uma dada situação e afetando determinados sujeitos (como exemplo, a atribuição de uma nota a um aluno). Em comum têm o facto de ambos serem comandos jurídicos unilaterais e a sua emissão está a cargo de um órgão competente no exercício de um poder público.
Bibliografia
Amaral, Diogo Freitas do. Curso
de Direito Administrativo. 3ª. Vol. II. Almedina, 2017.
Andrade, José Carlos
Vieira de. Lições de Direito Administrativo. 5ª. Imprensa da Universidade de Coimbra, 2017
Mariana Reis Ângelo | nº 57344
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