A necessidade permanente de conciliação das exigências de interesse público com as garantias dos particulares: a essência do Direito Administrativo
Segundo o professor Freitas do Amaral o princípio motor da
administração pública é o princípio da prossecução do interesse público, é esse
o fim da Administração Publica é para isso que ela existe. No entanto, diz-nos
o artigo 266/1º da CRP, que «a Administração Publica visa a prossecução
do interesse público, no respeito pelos interesses legalmente protegidos dos
cidadãos». Desta forma, este interesse público não tem um valor ilimitado,
está sujeito a certos limites como o princípio da legalidade e o princípio do
respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos particulares.
É precisamente a partir deste preceito constitucional que o
professor parte no sentido de afirmar que a essência do Direito Administrativo
é a permanente necessidade de conciliação das exigências de interesse público
com as garantias dos particulares. E no mesmo sentido se pronunciam os
professores Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado Matos que afirmam ser o
interesse público o norte da administração pública mas sempre limitada por este
respeito pelas posições jurídicas dos particulares.
É necessário ter sempre em conta que a noção de interesse público
é, tal como nos diz o professor Freitas do Amaral: “uma noção de conteúdo
variável não sendo possível definir o interesse público de uma forma rígida e
inflexível.” No entanto entende-se que existe uma exigência de satisfação das
necessidades coletivas.
Sendo a função administrativa uma função secundária do Estado
ela tem de estar subordinada ao princípio da legalidade o que na prática
significa que é a lei que define os interesses públicos a cargo da
administração não cabendo a esta qualquer papel na escolha dos interesses a
prosseguir salvo se a lei a habilitar para o efeito. Assim ela estará obrigada
a prosseguir o interesse público (estando proibida de prosseguir, ainda que
acessoriamente interesses privados) concretizado pela lei ou definido pela CRP
o que constitui um dos mais importantes limites da margem de livre decisão
administrativa.
Como referido anteriormente, o artigo 266º da CRP manifesta
uma clara preocupação com as posições jurídicas dos particulares o que leva a
concluir que há, sem dúvida, que prosseguir o interesse público mas
simultaneamente é exigido o respeito pelos direitos subjetivos e pelos
interesses legalmente protegidos dos particulares. (FREITAS DO AMARAL)
A partir desta conclusão entende-se que o alcance deste
princípio não é, o de impedir toda e qualquer afetação administrativa das
posições jurídicas dos particulares, a administração agressiva é natural à
atividade administrativa e sem ela esta ultima não existiria. Como defendem
MARCELO REBELO DE SOUSA E ANDRÉ SALGADO MATOS, o que este princípio proíbe não
é a afetação das posições jurídicas dos particulares mas sim a sua violação, ou
seja, a sua afetação com desrespeito pelos parâmetros de juridicidade da
atuação administrativa.
Esta constante preocupação de conciliação dos dois princípios
tem também ela uma especial relevância a nível do princípio da imparcialidade e
do princípio da proporcionalidade. Diz o primeiro que as posições jurídicas
subjetivas dos particulares devem ser ponderadas entre si e com os interesses
públicos em presença para a decisão do caso concreto. Já o princípio da
proporcionalidade proíbe que como resultado dessa ponderação se adotem meios de
prossecução do interesse público que lesem de forma inadequada, desnecessária ou
desrazoável as posições jurídicas subjetivas dos particulares (MARCELO REBELO DE
SOUSA E ANDRÉ SALGADO MATOS).
O princípio da legalidade nasceu e durante muito tempo foi
encarado como um limite à atuação administrativa estabelecido no interesse dos
particulares ou seja a sua função era a de proteger os direitos e interesses
destes. Atualmente não se verifica o mesmo, este princípio não visa apenas a
proteção dos direitos subjetivos e interesses legalmente protegidos dos
particulares mas também não visa apenas a proteção dos interesses objetivos da
AP. Visa simultaneamente garantir o respeito das normas aplicáveis quer no
interesse da Administração quer no interesse dos particulares.
Para os professores REBELO DE SOUSA e SALGADO MATOS não
existe autonomiado princípio do respeito
pelas posições jurídicas dos particulares face ao principio da legalidade.Para
estes, “trata-se apenas de uma dimensão subjetiva, naturalmente sublinhada pelo
papel que os direitos fundamentais desempenham no núcleo duro da Constituição
material num Estado de direito democrático”
Posição contrária manifesta o professor FREITAS DO AMARAL que
defende não bastar o cumprimento da lei por parte da administração para que
automaticamente se verifique o respeito pelo princípio em questão. Para além do
princípio da legalidade, diz-nos o professor que outros mecanismos jurídicos
foram postos em prática a fim de conferir uma proteção autónoma às
posições jurídicas subjetivas dos particulares além dos casos em que a violação
da legalidade ofende esses direitos e interesses. Mecanismos estes que visam ir
mais além na proteção das posições jurídicas singulares do que seria possível
caso se adotasse apenas a técnica do princípio da legalidade como única forma
de garantia desses mesmos direitos e interesses. Conclui então o professor que
o princípio do respeito pelos direitos subjetivos e interesses legalmente
protegidos dos particulares limita e subordina a AP muito para além da
limitação que para ela constitui o princípio da legalidade.
Bibliografia consultada:
Diogo Freitas do
Amaral (2016) Curso de Direito
Administrativo, 6ªEdiçao, volume II Almedina
Marcelo Rebelo de
Sousa e André Salgado Matos, Direito
Administrativo Geral, tomo I
Fátima Coelho
nº57116
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