Ato Administrativo: endeusamento indestrutível?
Ao refletir sobre ato administrativo, devido à sua fulcral importância,
têm-se por normal criar no pensamento que esta figura é algo acima de qualquer
outra coisa, talvez por se pensar que os mesmos são emanados pelo ente
supernatural que é a Administração Pública.
Este post incidirá sobre três figuras que mostram que não existe só uma
solução para resolver um conflito ou uma ilegalidade que surja, internamente,
no conteúdo de um ato, sendo que elas têm por objetivo tentar com que não seja
repercutida nos efeitos dos atos “deficitários” nenhuma ilegalidade e se o for
que a mesma possa ser, de certo modo, atenuada. Refiro-me à suspensão, à
sanação e à retificação do ato administrativo. É importante referir que também existem
figuras como a anulação ou revogação administrativa que extinguem os efeitos do
ato, mas não é sobre estas que este texto se irá deter.
A suspensão, apesar de não extinguir os efeitos do ato, imobiliza-o por
um definido período de tempo. Este ato não é suprimido da ordem jurídica, podendo
até ser válido, mas torna-se ineficaz. Seguindo o Professor Freitas do Amaral,
existem três formas diferentes de suspender um ato, são elas:
- Por força da
lei: também denominada “suspensão legal”, ocorre quando existem determinados
factos que, segundo a lei, concebem automaticamente o efeito suspensivo;
- Por ato
administrativo: conhecida também por “suspensão administrativa”, acontece todas
as vezes que seja gerado um ato administrativo cuja finalidade seja suspender
outro ato administrativo, sendo que estes atos são praticados por órgãos competentes
para o efeito, nomeadamente os órgãos a quem a lei confira de forma inequívoca o
poder de suspender; o órgão competente para a decisão final, caso os
interessados o requeiram ou até oficiosamente, pode tomar esta medida a título
provisório, tal como plasma o artigo 89º do Código do Procedimento
Administrativo (CPA); no seguimento de impugnação administrativa opcional, o órgão
apto para a analisar, como está contido no artigo 189º/2 CPA. Os motivos para o
realizarem são diversos;
- Por decisão de um tribunal administrativo: designada
também de “suspensão jurisdicional”, pode ser determinada por tribunal administrativo
habilitado, pela adoção de uma providência cautelar conservatória;
A retificação, segundo o professor supra enunciado é “o ato
administrativo secundário que visa emendar os erros de cálculo ou os erros
materiais contidos num ato administrativo primário anterior”. É uma forma de
corrigir erros que possam surgir, sendo que erros de cálculo são erros matemáticos
que se poderão encontrar em atos e, por seu turno, erros materiais são erros na
redação do ato. Tal como afirma o artigo 174º/1 CPA são “erros na expressão da
vontade do órgão administrativo”. A retificação tem, portanto uma função
corretiva. Os erros podem ser manifestos, se forem óbvios, ou não manifestos,
se forem de difícil deteção. Esta destrinça é fundamental para se saber qual o
regime aplicável à retificação. Ora, se forem erros manifestos, o seu regime
encontra-se regulado pelo artigo 174º CPA, onde se denota que este tipo de
erros podem ser retificados pelo órgão que tem competência para a revogação do
ato, a retificação pode ser produzida a qualquer momento, inclusivamente se o
prazo para a revogação já tenha expirado, pode ter lugar oficiosamente ou a
pedido dos interessados, os seus efeitos são retroativos e necessita ser realizada
sob a forma e com a publicidade que foi empregada para a execução do ato
retificado. O mesmo professor enuncia que se a Administração detetar o erro,
seja ele qual for, tem o dever jurídico de o retificar.
A sanação visa tentar recuperar um ato que anteriormente foi considerado
ilegal, corrigindo o vício que o afetava, estando assim em consonância com o
Princípio do Aproveitamento dos Atos Jurídicos. Para esta operação existem a
ratificação, a reforma e a conversão. Estes atos, que pertencem à espécie de
atos sobre atos, formam uma alteração do ato ilegal anterior, em vez da sua
extinção. O artigo 164º CPA regula, nos seus números, estas formas de sanação
de um ato administrativo. O Professor José Pedro Fernandes, define ratificação
como sendo “o ato administrativo pelo qual o órgão competente decide sanar um
ato inválido anteriormente praticado, suprindo a ilegalidade que o vicia”. Por
seu turno, o Professor Freitas do Amaral retém a distinção entre reforma e
conversão, sendo a primeira “o ato administrativo pelo qual se conserva um ato
anterior a parte não afetada de ilegalidade” e a última “o ato administrativo
pelo qual se aproveitam os elementos válidos de um ato ilegal para com eles se
compor um outro ato que seja legal”.
Em conclusão nem todos os atos administrativos necessitam da intervenção
destas figuras, mal seria se assim o fosse. Mesmo assim, existe uma maior
segurança pela parte de todos, sabendo que subsiste uma forma de alterar algo
que não está correto. A evolução, que ocorre nos nossos dias, não permitiria a inexistência
destas figuras. Estamos em constante aprendizagem, o mundo está a mudar e leva
consigo o Direito Administrativo. Só tem de se valorizar as aberturas às
mudanças que o CPA de 2015 trouxe, nomeadamente a grande inovação no que
toca à admissão da reforma e da conversão de atos nulos. Se é certo que têm de
existir regras superiores que ditem os modos de ser, essas mesmas regras não
podem ser encaradas como imutáveis, tal como os atos administrativos. Cada vez
mais a inalterabilidade se vai desvanecendo e com ela a crescente vaga de
conhecimento percecionado vai ser foco de novos atos administrativos aos quais
se seguirão outros e outros após estes. É aqui que se encontra o Direito
Administrativo no seu estado puro, nunca devendo ser esquecido, mas sim estando
sempre em constante revolução científica.
Bibliografia:
Amaral, Diogo
Freitas do, Curso de Direito Administrativo, Volume II, 3ª Edição, Almedina,
2016
Caetano, Marcello,
Manual de Direito Administrativo, Volume I, 10ª Edição, Almedina, 2007
Ivo Patrício, Número
56844
Turma 2º B,
Subturma 11
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