Contestação - Governo
Exmo.
(a) Sr. (a)
Juiz(a)
de Direito do Tribunal Administrativo do círculo de Lisboa
Campus
de Justiça
Rua
da Justiça nº 34
1990-011
Lisboa
Parque
dos Estados Lisboa
O
Governo, nas vozes do Ministro da Cultura e do Secretário de Estado da Cultura,
vem defender-se das alegações interpostas pelo Sindicato Nacional dos Agentes
Culturais.
Matéria de Facto:
1º
No ano de 2027,
decorreu o Concurso de Apoio às Artes para o ano de 2028.
2º
O Concurso de
Apoio às Artes consiste na atribuição anual de apoios financeiros do Estado a
entidades que exerçam atividades profissionais das áreas visuais, das artes
performativas e de cruzamento disciplinar. O Concurso de Apoio às Artes é
regulado pela Direção-Geral das Artes.
3º
Após a
publicação dos resultados do Concurso de Apoio às Artes de 2028, viveu-se uma
situação de contestação generalizada.
4º
O Sindicato
Nacional dos Agentes Culturais alega que os montantes atribuídos à Cultura
foram muito inferiores face ao valor desejável.
5º
O Sindicato
Nacional dos Agentes Culturais alega que os critérios utilizados no Concurso de
Apoio às Artes de 2028 foram vagos e imprecisos.
6º
O Governo
utilizou todos os meios a seu dispor para valorizar adequadamente a repartição
de apoios às artes, elaborando uma adequada ponderação de interesses, tendo em
vista unicamente o interesse público.
7º
O Governo
financiou os grupos “Os Afonsinhos do Condado” e “Sociedade Financeira para a
Promoção das Artes” de modo imparcial e de acordo com os critérios do concurso.
8º
O «Teatro
Experimental da Linha» não foi financiado devido à condecoração do seu diretor
artístico pelo Presidente da República por termos em atenção o princípio da
imparcialidade, não sendo aceitável haver favorecimentos. A orquestra “Portugal Jovem” recebe financiamento através
da “Orquestra da Câmara para Todas as Idades”.
9º
Após os vários
protestos, o Governo, pelas vozes do Ministro da Cultura e do Secretário de
Estado da Cultura, a que se juntou uma carta aberta do Primeiro-Ministro, confirmam
que o montante envolvido é superior ao comparado com o de anos anteriores.
10º
O Ministro da
Cultura delegou no Secretário de Estado da Cultura a competência para a
atribuição do financiamento em causa.
11º
O Governo
admite a existência de algumas situações irregulares, suscetíveis de serem
corrigidas administrativamente.
12º
O Sindicato
Nacional dos Agentes Culturais pretende recorrer judicialmente contestando as
regras do Concurso de Apoio às Artes de 2028 assim como os seus resultados.
13º
O Governo afirma
a sua disponibilidade para encontrar soluções, considerando que a matéria não é
suscetível de controlo jurisdicional, pois integra a reserva da Administração,
sendo apenas suscetível de controlo administrativo.
Matéria de Direito:
14º
O Concurso de Apoio às Artes consiste numa
subvenção, ou seja, numa atribuição de subsídios.
15º
A referida
subvenção consiste num ato administrativo primário permissivo, que versa pela
primeira vez sobre uma determinada situação possibilitando a tomada de uma
decisão que confere vantagens. A subvenção é um ato pelo qual um órgão da
Administração Pública atribui a um particular uma quantia pecuniária destinada
a cobrir os custos inerentes à prossecução de uma atividade privada,
reconhecida de interesse público.
16º
As subvenções
podem ser atribuídas por ato ou por contrato. Considera-se que esta subvenção é
atribuída por ato administrativo, aplicando-se o Código do Procedimento
Administrativo.
17º
O ato
administrativo encontra-se definido no artigo 148º do Código do Procedimento
Administrativo, consistindo nas decisões que visam produzir efeitos jurídicos
externos numa situação individual e concreta.
18º
Quanto à
competência para a realização dos concursos a nível da cultura, os mesmos
encontram-se a cargo do Ministro da Cultura, sendo este um órgão do Ministério
da Cultura e um órgão da Administração Direta do Estado a quem compete, ao
abrigo do artigo 19º/nº1 do Decreto-Lei nº 251º-A 2015 de 17 de Dezembro da lei
orgânica do Governo, formular, conduzir, executar e avaliar a política global e
coordenadora na área da cultura e domínios com ela relacionado.
18º - A
O Ministro da
Cultura estabeleceu uma delegação de poderes relativamente ao Secretário de
Estado da Cultura, nos termos do artigo 44º/1 do Código do Procedimento
Administrativo. A delegação de poderes consiste num ato pelo qual um órgão da
Administração, tendo a competência para decidir em determinada matéria, permite
a prática de atos administrativos sobre a mesma matéria, por outro órgão ou
agente. Para que a delegação de poderes seja eficaz é necessário estarem preenchidos três
requisitos, nomeadamente: uma lei de
habilitação (onde se preveja a faculdade de um órgão delegar poderes noutro); a
existência de delegante (órgão que pode delegar) e delegado (órgão em quem se
possa delegar) e ainda um ato de delegação, ou seja, o ato através do qual o
delegante concretiza a delegação dos seus poderes no delegado.
18º - B
Sob pena de
ilegalidade, os atos administrativos praticados pelo delegado dependem da
existência, validade e eficácia da lei habilitante, ficando irreversivelmente
inquinados pelo vício de incompetência se a mesma for inexistente, inválida ou
ineficaz. Neste caso, não tendo havido uma lei habilitante, a delegação não
preenche os requisitos originando uma incompetência relativa.
18º - C
Estando em
causa uma incompetência relativa, aplica-se o artigo 163º/1 e 2 do Código do
Procedimento Administrativo, sendo o ato meramente anulável, continuando a
produzir efeitos jurídicos. Nos termos do artigo 164º/3 do presente Código,
está a cargo do Ministro da Cultura o poder de ratificar o ato.
18º - D
Nos termos do artigo
163º/4 do Código do Procedimento, não tendo ocorrido qualquer anulação por
parte da Administração dentro dos prazos estabelecidos, tomamos como válido o
ato por ter sido sanado. O prazo estabelecido é de 6 meses a contar da data do
conhecimento pelo órgão competente da causa de invalidade, nos termos do artigo
168º/1 do referido Código. Está em causa uma irregularidade sanável pela
própria Administração.
19º
Todas as fases
do procedimento administrativo foram respeitadas, tendo o procedimento iniciado
oficiosamente, como estatui o artigo 53º do Código do Procedimento Administrativo,
correspondendo à fase inicial. Averiguaram-se os factos que interessavam à
decisão final e recolheram-se as provas que se mostravam necessárias, como
preveem os artigos 115º a 120º do referido Código, correspondendo à fase da
instrução.
19º - A
A audiência
prévia dos interessados não foi realizada devido ao número elevado dos
candidatos, havendo legitimidade para a dispensa da audiência, com base no artigo
124º/1/alínea D) do Código do Procedimento Administrativo, estando a razão
prevista no final da decisão tomada, como prevê o artigo 124º/2 do referido
Código. Na opinião do professor regente Vasco Pereira da Silva, tratando-se de
um direito fundamental, a audiência prévia dos interessados quando não
realizada gera uma inconstitucionalidade, do qual resulta a nulidade do ato
administrativo, segundo o artigo 161º/2/alínea D) do Código do Procedimento
Administrativo. Tendo sido realizada a dispensa da audiência prévia com a
devida fundamentação, constando esta numa exceção à regra, não há causa de
nulidade.
19º - B
O Secretário de
Estado da Cultura procedeu a uma consulta pública, de modo a auxiliar a
elaboração e recolha das opiniões dos interessados, com base no artigo 124º/2
do Código do Procedimento Administrativo.
19º - C
No decorrer da
formação da decisão final, o Governo regeu a sua atuação pelo princípio da
participação, previsto no artigo 12.º do Código do Procedimento Administrativo,
tendo este sido respeitado. A participação dos particulares foi assegurada
através da referida consulta pública, tendo os interessados enviado em suporte
digital os argumentos de reforço das suas candidaturas.
19º - D
Todas as
decisões foram fundamentadas, de acordo com o artigo 152º do Código do
Procedimento Administrativo, apresentando em anexo a prova documental dos casos
alegadamente de difícil compreensão.
19º - E
Na fase da
decisão praticou-se o ato administrativo. Na fase complementar os resultados do
concurso foram publicados e a decisão do ato administrativo foi devidamente
notificada aos seus destinatários, nos termos do artigo 114º do Código do Procedimento
Administrativo.
20º
A cultura tem
uma elevada importância para a sociedade, sendo uns dos pilares através do qual
se exprime a identidade nacional, de modo que o Estado promove a democratização
da cultura e coopera com todos os agentes culturais, nos termos do artigo 73º/2
e 78º/2 da Constituição da República Portuguesa.
21º
Dada a situação
de elevada dívida pública na qual Portugal ainda se encontra, o Governo não pôde
atribuir financiamentos excessivamente elevados, apesar de o montante atribuído
ser maior do que o de anos anteriores.
22º
O valor do
montante disponibilizado para a cultura encontra-se previsto no Orçamento do
Estado, sendo este o instrumento político essencial da atuação do Estado na
economia através do qual se determina a forma como vão ser geridos os dinheiros
públicos, seguindo o princípio da economia, eficiência e eficácia e o princípio
da Sustentabilidade das finanças públicas, expostos nos artigos 11º e 18º da Nova
Lei de Enquadramento Orçamental (Lei nº151/2015 de 11 de Setembro).
23º
A atribuição do valor do montante disponível para o
Ministério da Cultura compete ao Ministro das Finanças por força do artigo
14º/1 do Decreto-Lei nº 251-A, 2015 de 17 de Dezembro e do artigo 12º-E’ss da
Lei nº 151/2011 de 11 de Dezembro.
24º
O Governo pauta
a sua atuação pelo princípio da legalidade estabelecido no artigo 3º do Código
do Procedimento Administrativo.
25º
O Decreto-Lei nº 103/2017 de 24 de agosto regula
a atribuição de apoios financeiros do Estado, através da Direção-Geral das
Artes (DGARTES), a entidades que exerçam atividades profissionais nas áreas das
artes visuais, das artes performativas e de cruzamento disciplinar.
26º
De acordo com o
artigo 24.º/1 do Decreto-Lei nº 103/2017, os critérios adotados pela
Direção-Geral das Artes são estabelecidos pelo Ministério da Cultura. Os
critérios de atribuição de apoios financeiros encontram-se estabelecidos na
Portaria nº 301/2017, de 16 de outubro.
27º
Os poderes concedidos
à Administração podem ser vinculados e discricionários. Os primeiros, caso
tenham sido exercidos contra a lei, são objeto de controlo de legalidade. Os
segundos, caso tenham sido exercidos de modo inconveniente, são objeto de
controlo de mérito.
28º
Relativamente
aos conceitos indeterminados (“cujo conteúdo e extensão são em larga medida
incertos”), a sua utilização, segundo o Professor Diogo Freitas do Amaral,
justifica-se na necessidade de a lei deixar uma margem de livre apreciação de
certas situações a quem as conhece em concreto e a constante mudança das
conceções sociais às alterações de vida trazidas pela sociedade técnica.
29º
As expressões
“qualidade e viabilidade” são conceitos indeterminados e, neste caso
em concreto, é concedida
à Administração autonomia no poder de decisão, visto que se trata de uma
problemática suscetível de alterações em relação ao tempo e às capacidades
económicas da
Administração. A Administração tem a necessidade de, considerando as circunstâncias
de interesse público, tomar a decisão mais adequada.
30º
Com a expressão
“qualidade e viabilidade aferidas pela coerência do Orçamento face à dimensão
do projeto e dos recursos humanos e materiais necessários” a Administração
avalia a decisão. Trata-se de um caso em que a mesma não se cinge apenas aos efeitos
da decisão mas também aos pressupostos da mesma. A resposta dada pela
Administração quanto à distribuição dos fundos por todos o país é válida, não
havendo nenhum vício nesta tomada de decisão.
31º
Esta
interpretação de conceitos indeterminados releva uma verdadeira discricionariedade,
razão pela qual o tribunal não pode anular o ato Administrativo. Se o fizesse
estaria a desempenhar a função administrativa, ocorrendo o fenómeno da dupla
administração, a qual não estaria de acordo com o princípio da separação de
poderes, consagrado no artigo 111º da Constituição da República Portuguesa,
sendo inconstitucional.
32º
O investimento
realizado de forma dispersa por todo o território nacional fomenta a diversidade
de interesse cultural por toda a população. Desta forma, caminha-se num sentido
de multiplicidade de atividades culturais, diversificadas e heterogéneas,
enriquecendo o país culturalmente, de forma a consolidar e a projetar nacional
e internacionalmente a criatividade e inovação artísticas, a desenvolver a
sensibilidade e a pensamento crítico das populações, promovendo a sua
qualificação e coesão social e territorial. Deste modo, os princípios da
igualdade e imparcialidade, presentes nos artigos 6º e 9º do Código do Procedimento
Administrativo estão observados.
33º
A Administração
valorizou candidatos com projetos que se apresentaram inovadores da perspetiva
de que a atividade artística continuada, exercida há largos anos e reconhecida
como tal pela crítica e pelo público não necessita de reforços monetários do
Estado pois já tem relevo próprio. Consequentemente já se encontra numa posição
em que consegue lucrar com a atividade por si desenvolvida.
34º
Relativamente
ao controlo do exercício da Administração existem duas categorias diferentes. Pode
haver controlo de legalidade, se a mesma violou ou não a lei, e controlo de
mérito, que visa avaliar o bem fundado das decisões da Administração. O
controlo também pode ser administrativo, realizado pelos órgãos da
Administração, ou jurisdicional, realizado pelos tribunais. É de realçar que o
controlo de legalidade pode ser realizado pela Administração e pelos tribunais
e o de mérito apenas pode ser realizado pelos órgãos da Administração.
35º
Esta temática
assume primordial relevância na matéria de Direito Administrativo devido à
separação da Administração Pública dos tribunais. Atualmente, os tribunais já
não têm a legitimidade de exercer a função administrava nem a Administração de
exercer a função judicial.
36º
A iniciativa do
Sindicato Nacional dos Agentes Culturais de utilizar uma ação
judicial não é
válida por se tratar de uma matéria de Reserva da Administração. Os Tribunais
Administrativos não podem apreciar o mérito da decisão. Assim, não existe neste
caso um caso de violação do princípio da igualdade, proporcionalidade, da justiça,
imparcialidade e da boa-fé do ato Administrativo, razão pela qual não se aplica
o artigo 266º/2 da Constituição da República Portuguesa. A temática prende-se
em averiguar a inconveniência, não existindo nenhum fundamento para o ato ser
impugnado.
Parecer quanto à fundamentação das candidaturas para a subvenção do
concurso para o apoio às artes de 2028
Candidatura “Os
Afonsinhos do Condado”:
Relativamente
ao financiamento do grupo “Os Afonsinhos do Condado”, entende-se que a peça
sobre a independência de Portugal é de inegável interesse turístico, já que
exalta a história do nosso país sendo realizada na maravilhosa envolvente
histórico-cultural que é o Palácio de Guimarães, o Berço da Nação.
Ademais,
considera-se que o regulamento do concurso e seu âmbito de aplicação deve
abranger o maior número de regiões possíveis, de modo a descentralizar a
distribuição de fundos e a oferta cultural, dinamizando, assim, mais pontos do
país.
Subvenção –
concedida.
Candidatura
“Sociedade Financeira para a Proteção das Artes”:
Quanto à
“Sociedade Financeira para a Proteção das Artes”, entende-se que além de um
cruzamento de setores em potencial desenvolvimento, revela-se a mesma sociedade
de inquestionável interesse público, existindo claramente um caráter inovador,
interdisciplinar, que se refletirá, a médio/longo prazo, na garantia de mais e maiores apoios à
cultura e, consequentemente, melhores condições para a sua manifestação, sem
dependência do Estado, o que se revela bastante positivo na medida em que o
sector cultural terá fontes de financiamento mais alargadas, tanto de origem
pública como privada.
Subvenção –
concedida.
Candidatura
“Teatro Experimental da Linha”:
Referindo agora
o caso do “Teatro Experimental da Linha”, entende o Governo, face à sua
atividade e à condecoração do seu diretor artístico pelo Presidente da
República, ter a referida instituição a relevância e capacidade de angariação
de fundos suficientes para a continuação da sua atividade com sucesso, cabendo
ao Estado impulsionar novos projetos, de modo a abranger nos seus apoios todo o
tipo de atividades culturais.
Subvenção – não
concedida.
Candidatura
“Orquestra Portugal Jovem”:
Quanto à
“Orquestra de Câmara para Todas as Idades”, já estando a mesma a receber
financiamento estadual, não entende o Governo haver necessidade de vir a
financiar um desdobramento da mesma que se viria a denominar de “Orquestra
Portugal Jovem”, apenas pelo facto de a maior parte dos seus membros ser menor.
Para além do facto de não ser a faixa etária dos membros um parâmetro de
seleção do Concurso em causa, estes continuam a poder manifestar a sua
atividade cultural na “Orquestra de Câmara para Todas as Idades”, pelo que o
financiamento da segunda, seria um desperdício de recursos valiosos para outro
tipo de atividades.
Subvenção – não
concedida.
Fundamentação
realizada no âmbito do artigo 152º do Código do Procedimento Administrativo.
7 de Maio de
2027
O Governo
Prova 2:
Carta aberta do Primeiro Ministro
Vossas Excelências,
Estou a escrever esta carta com o intuito de vos
congratular pelo modo exemplar e responsável como estão a proceder neste
processo. Os montantes envolvidos para o atual concurso são, deveras, os mais
indicados dado a situação de grande dívida pública que existe no seio de
Portugal.
Os atuais montantes são os mais equitativos e mais
justos relativamente aos de anos anteriores. Sendo a Cultura bastante
importante para o desenvolvimento de Portugal, temos também de ter em
consideração os esforços que fazemos para que a dívida diminua, possibilitando,
ao mesmo tempo, atribuir as melhores qualidades de vida à população portuguesa.
Não tendo competência direta relativamente ao
Ministério da Cultura, gostaria apenas de demonstrar o meu agrado pela posição
tomada por vós.
O Primeiro
Ministro,
Joaquim Hortinha
Trabalho
realizado por:
Famata Sanhá nº
26306
Francisco
Veloso nº 56776
Guilherme
Martins nº 56723
Joana
Ochsemberg nº 26158
Manuel
Figueiredo nº 56637
Olena Verush nº
57089
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