Suspensão, rectificação e sanação do ato administrativo

            Os efeitos de um ato administrativo extinguem-se com a sua revogação ou anulação, isto é, este deixa de fazer parte do ordenamento jurídico.
            Ao contrário do que acontece nestas situações, no caso da suspensão, o ato administrativo não desaparece, os seus efeitos apenas são paralisados por um determinado período de tempo. Um ato suspenso continua a existir na ordem jurídica e será porventura válido, apenas se torna ineficaz. Relativamente à revogação, a suspensão é um minus.
            Desta forma, a noção de suspensão prende-se com a paralisação temporária dos efeitos jurídicos de um ato.
            A suspensão pode ocorrer de uma destas três formas:
·         Por força da lei;
·         Por ato administrativo;
·         Por decisão de um tribunal administrativo.
Quanto à primeira circunstância, denominada suspensão legal, salienta-se que ocorre quando certos factos, nos termos da lei, determinam o efeito suspensivo automaticamente. Pode dar-se como exemplo a subordinação de um ato administrativo a condição suspensiva ou termo inicial.
O segundo caso, a suspensão administrativa, acontece sempre que um órgão competente para o efeito assim o decida, suspendendo um ato administrativo anterior através de um novo ato administrativo. Os motivos podem prender-se com dúvidas sobre a legalidade, ou conveniência do ato primário, desejo de reapreciar o seu conteúdo ou ponderar consequências, entre outros. Os órgãos competentes para esta suspensão são os órgãos a quem a lei conferir expressamente este poder, os órgãos competentes para a decisão final no âmbito de uma medida provisória requerida pelos interessados ou ordenada oficiosamente durante um procedimento de revogação administrativa (arts. 89º e 90º CPA) ou o órgão competente para apreciação de uma impugnação administrativa facultativa na sua sequência (art. 189º/2 CPA).
Este tipo de suspensão tem um prazo máximo de duração.
Por último, refere-se a suspensão jurisdicional, que é decidida pelo tribunal administrativo competente através de uma providência cautelar conservatória, com a finalidade de assegurar a utilidade da sentença que será proferida numa acção impugnatória de atos administrativos (art. 112º/2 a) CPTA)
Posto isto, passemos agora à retificação do ato administrativo, que é essencialmente um ato administrativo secundário destinado a emendar os erros de cálculo ou materiais contidos num ato primário. A sua função não é, assim, destrutiva, suspensória ou modificatória, mas sim correctiva. Distinguem-se os erros de cálculo e materiais conforme ocorram no âmbito de operações matemáticas ou na redação do texto. Em ambos os casos, trata-se de erros na expressão da vontade do órgão administrativo (art. 174º/1 CPA).
Existem dois regimes distintos da retificação: o primeiro (regime especial – art. 174º CPA) aplica-se quando estamos perante um erro manifesto, ou seja, ostensivo, evidente; o segundo (regime geral) aplica-se quando o erro não é manifesto, mas sim duvidoso, difícil de detetar.
O artigo 174º do CPA explicita que os erros manifestos podem ser rectificados pelo órgão competente e que a revogação pode ser feita a todo o tempo, mesmo expirado o prazo mais longo que existisse para a revogação, assim como tem efeitos retroactivos e deve ser feita sob a forma e com a publicidade usadas no ato primário, tendo lugar oficiosamente ou a pedido dos interessados.
Por fim, analisam-se os atos administrativos que têm em vista a sanação da ilegalidade de um ato anterior.
Esta sanação dá-se quando um órgãos administrativo, perante uma ilegalidade, decida, em função do princípio do aproveitamento dos atos jurícos, recuperar o ato, afastando o vício, ou reutilizar alguns dos seus elementos.
Nestes termos, recorre-se à ratificação, reforma ou conversão, sanando os efeitos pelo ato anterior produzidos, no caso de anulação, ou produzindo novos efeitos, no caso de nulidade. Em qualquer um destes casos, os efeitos produzem-se ex tunc.
A ratificação, reforma ou conversão configuram uma modificação e diz o artigo 164º/1 CPA que lhes são aplicáveis as normas que regulam a competência para a anulação administrativa dos atos inválidos e a sua tempestividade.
Ora, a ratificação consiste no ato administrativo pelo qual o órgão competente decide sanar um ato inválido anteriormente praticado, suprindo a ilegalidade que o vicia. Dá-se como exemplo a repetição de votação ilegalmente feita por votação nominal.
A reforma, por sua vez, é o ato administrativo pelo qual se conserva de um ato anterior a parte não afetada de ilegalidade. A redução de uma licença ilegalmente concedida por três anos a uma licença por um ano.
Por último, a conversão caracteriza-se pelo ato administrativo pelo qual se aproveitam os elementos válidos de um ato ilegal para com eles se compor um outro ato que seja legal. Ao contrário da reforma, a conversão implica a transfiguração jurídica do ato. O caso de nomeação definitiva que é convertida em provimento interino, por se encontrarem preenchidos naquela apenas os requisitos legalmente previstos para estes é um exemplo.
As orientações comuns das três modalidades de sanação (ratificação, reforma e conversão) são o facto de os atos nulos só poderem ser objecto de reforma ou conversão, das normas de competência e tempestividade aplicáveis são as da anulação administrativa dos atos inválidos, da reforma e conversão obedecerem às normas procedimentais aplicáveis ao novo ato, de, em caso de incompetência, o poder de ratificar o ato ilegal caber ao órgão competente para a sua prática (e não ao órgão que agiu com incompetência, de que não havendo uma alteração ao regime legal, a ratificação, a reforma e a conversão retroagirem os seus efeitos à data dos atos a que respeitam e de a eficácia retroactiva de tais atos não prejudicar a possibilidade de anulação dos efeitos lesivos produzidos durante o período de tempo que os tiver precedido, quando os mesmos sejam praticados na pendência de processo impugnatório e respeitem os atos que envolvam a imposição de deveres, encargos, ónus ou sujeições, a aplicação de sanções ou a restrição de direitos e interesses legalmente protegidos.
A razão pela qual o CPA permite e reforma e conversão dos atos nulos mas não a sua conversão talvez se prenda com a lógica jurídica: os atos nulos são insanáveis, por isso não é possível suprir a ilegalidade que os vicia; por outro lado, podem ser reformados ou convertidos, pois, na reforma, exclui-se a parte viciada, subsistindo a parte legal e, na conversão, eliminam-se os elementos viciados e, com os elementos sãos, cria-se um novo ato.


Eduarda Cardoso, 57080

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